Eram velas, todas de cera, cada uma delas
colocadas no altar em frente a imagem que estava ali, desde muito novo eu via
os moradores indo e vindo, colocando suas velas, mas o altar era de madeira e a
porta um dia ficou aberta, uma das velas que não tinham se apagado caiu e
aquilo tudo virou cinzas.
Pretas
e cinzentas fuligens de um santo e eles choraram, quando perceberam, a fumaça
já me deixava tonta, mesmo recolhida na escuridão, eu pude vê-los buscando baldes
e gritando “Por que você não nos chamou?”, suas feições demonstravam o quão
humildes eles eram, também mostravam lagrimas, pessoas correndo, algumas
tossindo, mas a pequena igreja não queimou.
Durante
anos o canto enegrecido das chamas ficou ali, agora com a porta lateral
trancada com cadeados e depois de alguns anos, uma nova imagem chegou, uma
grande estatua, generosa de braços abertos e sorriso benevolente, não era a
mesma, mas ainda sim, as velas aos poucos voltaram, e depois de alguns dias os
beijos no pé da santa, os choros, as rezas, toda a rotina normal, parecia que a
madeira para manter a cabeça fora da água estava de volta. A fé, que não tem
nada de ordinária ou mundana, que é capaz de transpor obstáculos incalculáveis talvez
seja a resposta que os humanos precisem.
Cada
um de nós parece compartilhar de uma fé intangível, algo que acreditamos, como
um futuro melhor, um novo dia, uma poderosa teia entrelaçando conforto, amor,
amizade onde poderemos nos apoiar de quando em quando. Ver todas essas pessoas
e suas orações, toda a fé e esperança que elas trazem desperta uma duvida
interessante, se não acreditarmos em algo maior, algo que seja exponencialmente
mais do que qualquer um imagina e com certeza maior do que qualquer religião
diz saber ser, acreditaríamos em que? Se não soubermos que existe uma forma de
ordem no caos e que confortavelmente a pós-vida se apresenta, será que teceríamos
com tanto cuidado, tanto tempo perdido?
Eu
sinceramente não sei, mas como uma aranha em um canto de uma igrejinha, eu acho
que eu devo acreditar que existe uma força que ordena o caos, que existe algo
que move as cordas nessa teia maior. Mas não tenho certeza, afinal como posso
eu ter tanta certeza? Sou apenas uma aranha.
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